Processamento cognitivo do texto

Diferenças entre tipos de leitores

1. Leitura ascendente
           
     O conceito de leitor ascendente consiste na dependência do leitor ante as informações contidas no texto o qual o leitor interage. As informações obtidas pelo leitor são básicas para o entendimento da mensagem passada, sem buscar aprofundamento naquilo que o texto proporciona, usando apenas o seu conhecimento empírico para buscar significância do que lê.

2. Leitura descendente
           
       O conceito de leitor descendente consiste na vontade de aprofundamento, na busca pelo conhecimento e interação feita pelo leitor com as informações contidas no texto. Alguns textos carregam características mais complexas em sua linguagem e modo de produção, os quais utilizam de vocabulário mais formal e abrangente, assim como podem utilizar de recursos intertextuais, trazendo referências de outros textos e escritores.

Objeto de estudo:
“JOSÉ

E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
Você que é sem nome,
que zomba dos outros,
Você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?

Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?

E agora, José?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio, - e agora?

Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais!
José, e agora?

Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse,
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja do galope,
você marcha, José!
José, para onde?

Carlos Drummond de Andrade

Análise de objeto de estudo

          No poema José de Carlos Drummond de Andrade, podemos ter dois tipos de entendimentos, ambos com base no que já foi explicado sobre leitura ascendente ou descendente. No caso, um leitor analisador, que é baseado na leitura ascendente, lerá o poema e simplesmente entenderá as palavras, sem procurar significância do que o poeta transmite em sua mensagem. O leitor construtor, que é baseado na leitura descendente,  por sua vez, entenderá que a personagem criada pelo poeta, é na verdade, todo aquele que ler a poesia, todos são “José”.

3. Leitor analisador, cooperativo e construtor

          O conceito de leitura analítica caracteriza-se pela interação entre leitor e texto, fazendo uso adequado do processo cognitivo, levando em consideração o valor linguístico da mensagem lida.
O leitor analisador é caracterizado pela busca rasa de informações no texto lido, entendendo e contentando-se com o que está escrito, sem buscar aprofundamento sobre quaisquer informações que necessitem de maiores pesquisas
O leitor construtor é caracterizado por além da leitura básica das informações contidas no texto, por também procurar maiores informações contidas no texto, contextualizando informações que possam ser desconhecidas pelo leitor, por questões de falta de conhecimento ou por diferença de época.

3.1 Leitor reconstrutor
           
          O conceito de leitor reconstrutor baseia-se não apenas na leitura e compreensão das informações contidas no texto, mas também do seu uso como produto funcional de produção e de atuação na reconstrução de ideias. Este argumento pode ser exemplificado por meio da produção sendo vista como um processo de planejamento do autor com o intuito de, a partir de um curso de ação para satisfazer objetivos, utilizar estratégias comunicativas de codificação da mensagem.

Conclusão

          O tipo de leitura assumido pelo professor permite definir uma concepção de leitor que vai ser originado desse ensino- aprendizagem. Portanto, se optarmos pelo conceito de leitura como um processo descendente, o leitor não é mais visto como um repetidor passivo, mas como um produtor de significados, pois estará acionando seu potencial criativo e seus conhecimentos prévios e inserindo-se no mundo sócio-cultural. Isso é apenas um fragmento de uma concepção clara de leitura da qual  os envolvidos durante o ato de ler poderão repensar. Ao professor competente e criativo, caberá a tarefa de articular atividades significativas que induzam o aluno a utilizar e desenvolver sua capacidade cognitiva e metacognitiva, já que tomará consciência do que faz e por que o faz. Então, a leitura e a linguagem, compreendidas como lugar de interação humana e social, constituirão a si e ao sujeito não um conjunto de códigos e normas irrevogáveis, mas um trabalho (ação para transformar) social e sempre em curso. Portanto, se a aprendizagem da leitura quiser evoluir para o desenvolvimento do sujeito, seu aqui e agora tem de ser respeitado e valorizado. Seus conhecimentos prévios de mundo e de linguagem devem ser vistos não como síntese do passado, mas como proposta de contribuição para leituras futuras. Dessa forma, a leitura sendo vista não como ato isolado de um indivíduo diante da escrita do outro indivíduo, supõe a imersão no contexto social da linguagem e da aprendizagem, através da interação com o outro. Leitor e autor, sujeitos com suas respectivas histórias de leituras de mundo, são responsáveis pela construção de transformações a partir da tomada de consciência da importância de ser cidadão no mundo e do mundo.

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